As Três Vidas de Yves Badyh
Renascer aos 80 anos! A primeira impressão... Ao olhar e falar com Yves Badyh, pela primeira vez, a energia positiva emanada foi imediata, de uma simpatia rara para alguém com uma carreira de sucesso, com mais de 60 anos. Não houve tempo a perder, deixou-me de imediato no patamar da amizade. Por de trás dos longos cabelos brancos e de um olhar marcado pela experiência, Badyh transmite um espírito leve e jovem. O ambiente estava perfeito, uma conversa informal à beira-mar com um artista internacional, pupilo de Salvador Dali, e a sua curadora Olga e Sousa. Um privilégio ouvir na primeira pessoa o relato de uma vida tão inspiradora... Desde o adolescente que foge em direção ao sonho, aos ensinamentos de Dali, às malhas do mundo da droga e do álcool, até ao aprender a viver de novo!
A busca pelo sonho! Nascido em Pointe-à-Pitre, Guadalupe, no seio de uma família da nobreza libanesa, a dinastia “Les Dahdah” *1. Um destino premeditado pelo patriarca da família estava marcado, para assim assegurar o legado dos “Dahdah”, mas a vocação de Yves Badyh El-Dahdah gritava mais alto e passava pelo mundo encantado dos pincéis e do seu “ídolo” Salvador Dali. Com 20 anos, quase sem dinheiro, levando apenas sonhos na mala, foge de casa e ruma a Paris.
Desde de tenra idade, Yves Badyh sentiu que a sua felicidade estava na arte, mas o seu pai, um respeitável homem de negócios libanês, nunca deu apoio a este talento e desvalorizava as ambições do filho, afirmando que Yves seria um “boémio”. Apesar da opressão familiar, esquecer a sua paixão nunca foi uma opção para Badyh, que ia criando as suas obras às escondidas. Para sua surpresa, num encontro inusitado com Charles Aznavour, que fora atuar a Guadapule, o famoso cantor francês seria o primeiro comprador de um quadro de Yves Badyh. A validação do trabalho como aspirante a artista foi determinante para o futuro que se avizinhava!
Em meados da década de 60, a “Águia Negra”, como é apelidado pelos amigos devido a vestir apenas de preto, recusou ficar engaiolado num caminho preconcebido e abandona a vida confortável na sua terra natal, Guadalupe, voando em busca de um caminho incerto.
“J'ai fui ma famille pour "vivre en bohémien", mais je crois que mon père me l'a pardonné par la suite.
Fugi da minha família para ‘viver como um boémio’, mas acredito que o meu pai me perdoou por isso.”Yves Badyh
Um início atribulado...até ao reencontro com Charles Aznavour, em 1964...
Yves Badyh, de jovem artista a pupilo do seu ídolo Salvador Dali...
Uma amizade que viria a durar mais de 50 anos*2, Charles Aznavour apoia o jovem pintor apresentando-o a Jacques Carpentier, um conhecido galerista parisiense, que se tornará o seu primeiro agente, que é também o agente de Salvador Dali em França. “Graças a Charles Aznavour, que estava muito próximo de Dali, o encontro com Salvador Dali aconteceu. O que não foi planeado foi que o mestre me mantivesse durante quatro meses na sua casa, em Cadaqués (Espanha), quando só devia passar dois dias, juntamente com Jacques Carpentier.
O que mais o inspirou em Dali? Em primeiro lugar, a sua espiritualidade no seu trabalho, e a sua técnica incrivelmente precisa. Posso dizer que ele é o pai do Hiper-realismo. Dali é, a meu ver, o maior génio do século XX.”
O que aprendeu com Salvador Dali? É preciso saber que Dali era um homem muito desagradável, cheio de si mesmo, tirânico, com um ego demasiado grande. Claro que me ensinou a sua técnica, mas de uma forma muito "distante", e enquanto "Mestre" porque queria controlar o meu trabalho. Por vezes, enquanto eu estava a trabalhar, ele entrava lentamente na sala, ficava nas minhas costas e observava-me. Eu sabia que ele estava atrás de mim e fingi-a não saber. Outras vezes, para mostrar que não estava contente, dava-me palmadinhas na parte de trás da cabeça e dizia "Tss, Tss! — Risos.
E, no final, com uma visão “a posteriori”, lamento não ter apreciado mais os seus ensinamentos e a sua presença.
Se pudesse voltar no tempo o que mudaria? Se eu pudesse voltar no tempo e reviver o período com Salvador Dali, revivê-lo-ia de uma forma diferente, e acima de tudo estaria mais consciente de estar na casa de Salvador Dali, o que não era o caso antes!
Após o seu período surrealista seguirá o período figurativo e o período abstrato. Várias das suas pinturas fazem parte de coleções internacionais. Especialmente no Japão e nos Estados Unidos.
O salto para a fotografia... Yves Bayh começou a sua carreira artística pela pintura, mas rapidamente (em 1970) teve “a sorte de conhecer o dono da grande revista de moda “Harper's Bazaar”, que o contratou como fotógrafo, durante quatro anos. “Depois tive outros clientes como a Cosmopolitan, Vogue, mas também tive o privilégio de ter o orçamento da Volvo para toda a Europa. Foi nesta altura que conheci Roger Moore que fazia de Simon Templar numa série de televisão, “The Holy”, fiquei encarregado de fazer todas as filmagens publicitárias da Volvo. Tornei-me muito próximo de Roger.” Partilha.
O artista faz questão de reforçar que foi com a fotografia que se tornou mais conhecido no mundo das artes: “para ser honesto, não me tornei famoso através da pintura, mas sim através da fotografia. Eu era, penso eu (risos), um bom fotógrafo de moda, depois um fotógrafo conceptual. Também se deve dizer que a fotografia fez-me ganhar mais dinheiro do que a pintura.” Sublinha.
Sucesso, drogas e álcool! Um apogeu que nos intervalos trouxe consigo um acordar para uma realidade de sofrimento emergente da adição. O glamour do mundo artístico e da moda levou Yves Badyh, no auge da sua carreira, a cair nas malhas das drogas e do álcool, aquele que seria um cenário de risco na juventude, saltou gerações, surgiu na vida do artista já sexagenário, à época.
Um “período de drogas e álcool que foi um verdadeiro pesadelo na minha vida”, afirma Badyh em tom de arrependimento. Com um brilho de emoção nos olhos, o artista fez questão de falar sobre esta “fase negra” da sua vida para transmitir, principalmente aos jovens, que este é um mundo no qual não vale a pena entrar...um mundo tóxico. “Quando decidi parar, recusei-me a entrar numa clínica de reabilitação. Fui para o exílio sozinho nas montanhas, no Sul de França, onde estava isolado de tudo. Fiz o desmame das drogas sozinho, sem a ajuda de médicos, e ganhei a batalha sozinho. Era suposto ficar lá durante três meses, mas no final fiquei isolado durante três anos.
O regresso a Paris e a recaída! Após uma recaída em 2010, depois outra em 2014: “devo a minha remissão total a Radjat Padman Kapoor, um mestre de ioga, em 2015, eu tinha 73 anos de idade. Ele mudou a minha vida, melhorou-a. A sua morte tem-me afetado muito. Tenho saudades dele. Graças também à meditação que ele me ensinou, e ao exercício físico que pratico todos os dias durante uma hora. Já passaram 7 anos, e nunca mais vou cair na armadilha do álcool e das drogas. É por isso que quero ajudar os jovens a seguir o meu exemplo.
Renasce aos 80 anos. Pai de duas mulheres, Salma, de 51 anos, e Jennifer, de 56 anos, Yves Badyh, também avô de sete netos, dois rapazes e cinco raparigas, vê a idade apenas como um número, acreditando no poder da mente na transformação do Ser.
Quem é o Yves Badyh que vê ao espelho hoje? Um homem que teve três vidas: aquela em que cometeu erros, aquela em que aprendeu a cometer menos erros, e aquela em que hoje está a aprender a viver de novo.
Yves Badyh trouxe a sua arte para os espaços portugueses, pelas mãos da curadora, e sua agente, Olga e Sousa. Badyh garante que um dos seus objetivos é viver em Portugal.
“O Universo uniu dois seres com um espírito perfeccionistas, criativos, profissionais como um vulcão em permanente erupção porém sempre com as palavras amizade e amor ao próximo nos seus corações.
O que mais gosto em Badhy … O seu poder de resposta e constante capacidade de criar e sonhar.
O que me une ao Badhy profissional e pessoal: lealdade, amizade e a nossa, posso dizer, complementar experiência de vida embora sejamos de gerações diferentes.”
Olga e Sousa
“Body´S In The City”... É o mote da próxima exposição de Yves Badyh, em Lisboa, onde se destaca a “Estrutura Urbana”. Nesta montra vai encontrar pintura e escultura unidas, em parceria com a artista Ivone Gaipi...
“Vivo no ritmo de preparação das minhas duas exposições em Portugal. A fadiga é sentida e por vezes a excitação de ter esquecido um pormenor. Sou um ultra perfeccionista e acima de tudo crítico de mim mesmo. Esta é uma qualidade, mas é exaustiva.”
Yves Badyh
*2 “Une amitié brisée” — Uma amizade quebrada. No mundo do “show business” são raras as amizades longas. Esta foi uma relação de sintonia desde o primeiro encontro, fortalecida devido a um amor compartilhado e apaixonado pela arte, Charles Aznavour como colecionador, Yves Badyh como pintor. Este livro, da autoria de Yves Badyh, relata esses cinquenta anos de amizade repletos de armadilhas criadas para afastarem os dois homens. Uma história que parece um romance, revelações surpreendentes sobre este grande artista que foi Charles Aznavour, na sua prestigiosa carreira, mas também a troca de cartas entre os dois.
“C'est comme d'habitude la jalousie et la méchanceté humaine qui a brisé notre amitié de 50 ans. Nous sommes restés séparés pendant plusieurs années, puis c'est Charles qui est revenu vers moi.
Como sempre, o ciúme e a maldade humana acabaram com a nossa amizade de 50 anos. Estivemos separados durante vários anos, e depois Charles voltou para mim.”
Yves Badyh
Em homenagem à amizade entre Yves Badyh e Charles Aznavour deixo-lhe esta música do cantor francês — La Bohème
*1 Quem são os “El-Dahdah”? A dinastia remonta ao séc. XIV, esta que é uma das dinastias mais importantes do Líbano. Uma antiga família libanesa maronita que foi enobrecida pelo Emir Bashir pelos serviços prestados pelos funcionários públicos na sua casa. Ele deu-lhes a região de Aramoun-Kesrouan. Os Dahdah eram muito populares e eram conhecidos por dar a colheita das suas terras aos camponeses.
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