O Direito de Uso e Habitação
Na “Lei de bases da habitação”, divulgada na página oficial da Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa, podemos ler: “Todos têm direito, para si e para a sua família, a uma habitação de dimensão adequada, em condições de higiene e conforto e que preserve a intimidade pessoal e a privacidade familiar”. A afirmação está clara, mas com o aumento do valor das rendas esta realidade está cada vez mais longe de ser aplicada, hoje, o número de famílias em situação de risco aumenta diariamente.
Outra questão que levanta dúvidas está directamente relacionada com os seniores. Para responder a algumas dessas imprecisões procuramos mais sobre o direito à habitação no livro do Centro de Estudos Dantas Rodrigues: “Direito dos Seniores - Guia jurídico para protecção dos mais velhos”.
O direito de uso, cujo regime jurídico vem previsto nos artigos 1484.º a 1490.º do Código Civil, é um direito de carácter estritamente pessoal e tem uma natureza semelhante ao direito de usufruto, sendo um direito real menor que o direito de propriedade.
É, todavia, mais restrito que o direito de usufruto, já que o seu exercício tem de ser direto.
O direito de uso pode ter por objeto coisas móveis ou imóveis e está sujeito à regra da intransmissibilidade. Neste sentido, por ser insuscetível de ser exercido por outrem, é impenhorável.
Como comentado por Pires de Lima e Antunes Varela “trata-se, no fundo, de um puro corolário do carácter estritamente pessoal do direito, muito próximo, na sua finalidade, da prestação alimentar (cfr. Art.º 2008.º, 1 e 2). Envolvendo o uso e habitação a ideia de utilização direta da coisa ou do consumo direto dos frutos, a sua transmissão pode dizer-se que colidia com a natureza do direito” - Código Civil, anotado, vol. III, 1987, pág. 551).
Não admira, assim, que “o direito do uso seja visto como um usufruto mais restrito, quer quanto à extensão do direito, quer quanto à sua disponibilidade” (Luiz da Cunha Gonçalves, Da Propriedade e da Posse, Ática, Lisboa, 1952, pág. 165).
Enquanto o usufrutuário pode arrendar, ceder, trespassar, hipotecar, o usuário apenas pode servir-se de certa coisa alheia, englobando a possibilidade de ficar com os respetivos frutos na medida das suas necessidades e das da sua família.
Quando esse direito de uso recair sobre uma casa de habitação, denomina-se direito de habitação.
Os direitos de uso e habitação constituem-se e extinguem-se pelo mesmo modo que o usufruto conforme o artigo 1485.º do Código Civil, e estes direitos reais extinguem-se, entre outras formas, pela morte do seu titular – vide alínea a) do n.º 1 do artigo 1476.º do mesmo diploma legal.
Saliente-se por fim que, naqueles casos em que os seniores vivam em união de facto, em caso de morte do membro da união de facto proprietário da casa de morada da família e do respetivo recheio, o membro sobrevivo pode permanecer na casa, pelo prazo de cinco anos, como titular de um direito real de habitação e de um direito de uso do recheio.
No caso de a união de facto ter começado há mais de cinco anos antes da morte, os direitos previstos no número anterior são conferidos por tempo igual ao da duração da união.
Exemplo:
João, divorciado, de 81 anos, vive com Bernardete, viúva, de 77 anos, no apartamento desta, desde fevereiro de 2012.
Bernardete veio a falecer em janeiro de 2021.
António pode continuar a habitar o apartamento de Bernardete, bem como a usar todo o recheio que lá se encontra pelo período de 9 anos, porquanto foi esse o tempo da duração da união.
Dúvidas frequentes...
Gabriel, 75 anos
Vivi com a minha companheira em união de facto. Posso continuar a residir no apartamento desta após a sua morte?
► Sim, durante o período mínimo de 5 anos. Como a duração da relação foi de 9 anos, será esse o tempo do direito de uso e habitação atribuído.
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► No próximo artigo vamos partilhar algumas minutas para ajudá-lo na hora de fazer cumprir “O Seu Direito”...
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► Rubrica, em parceria com a Dantas Rodrigues & Associados