Tomar: O bastião Templário que salvou Portugal
Património Cultural das Rotas Portuguesas a Santiago de Compostela
A História, as Lendas e o Património dos Caminhos de Santiago
Capítulo VII – Pelo Caminho Central, de Lisboa ao Porto tanto património para descobrir – Parte 3
A Golegã, conhecida pela sua famosa feira do cavalo, já ficou para trás, 22 quilómetros depois o peregrino entra de cabeça na História. Ao entrar em Tomar depara-se com um dos mais importantes bastiões da Ordem dos Pobres Cavaleiros de Cristo e do Templo de Salomão. E como foi importante para a perpetuação de uma jovem nação.
É provavelmente a ordem religiosa militar mais famosa de sempre. Envolta num manto espesso de mistério, foram muitas as teorias da conspiração que se cogitaram à volta do verdadeiro papel e significado que a ordem dos Templários representara na Idade Média, desde o momento em que esta foi fundada, no tempo da primeira cruzada, por Hugo de Payens, com a proteção do rei Balduino II de Jerusalém, em 1118, até ao fim violento, com muitos dos cavaleiros condenados à fogueira (inclusivamente o último grão-mestre, Jacques de Molay), às mãos de Filipe IV “o Belo” e o Papa Clemente V, em 1312.
Fotografia | São Bernardo de Claraval - Autor, Jaci XIII
Redigida por S. Bernardo de Claraval, poderoso monge da ordem Beneditina de Cister (e primo de D. Henrique de Borgonha, pai de D. Afonso Henriques), a regra templária foi um dos documentos mais importantes da Idade Média, no que concerne à história dos princípios de cavalaria que norteavam os destinos, não só dos próprios monges guerreiros do Templo mas toda uma elite nobre, cujos filhos ansiavam ganhar prestígio e poder com as lutas contra os muçulmanos, almejando um dia tornarem-se cavaleiros vestidos com o tradicional manto branco com a cruz escarlate, a indumentária com que os cavaleiros templários seriam imortalizados.
Bernardo de Claraval terá sido o responsável pela introdução da Ordem de Cister no território português, com o seu nome associado à construção do Mosteiro de Alcobaça.
As más-línguas referem a importância de Bernardo de Claraval na entrada dos Templários no jovem território português, incumbidos de proteger os territórios cristãos da nova nação, ao norte do rio Tejo, revitalizando castelos e construindo novas fortalezas ao longo de uma rota conhecida como a “Linha do Tejo”, tendo precisamente o Castelo de Tomar como centro fundamental do poder templário, apoiado por outras importantes guarnições como o Castelo de Almourol, Castelo de Ceras, Castelo Branco, Castelo de Palmela ou ainda o Castelo de Soure, entre outros.
A principal função dos cavaleiros Templários, desde a sua fundação, foi a de proteger a vida dos peregrinos rumo à Terra Santa. Com a queda de Jerusalém, em 1187, os cavaleiros viraram-se definitivamente para uma nova cruzada contra os mouros, desta feita na Península Ibérica, começando por defender e assegurar a proteção dos peregrinos a caminho de Santiago de Compostela, já considerada naquela época como a terceira cidade santa do Cristianismo, depois de Jerusalém e de Roma.
Fotografia | Santa Maria de Eunate, a célebre igreja pentagonal. É uma igreja românica situada no município de Muruzábal, Navarra, Espanha.
Muitos foram os redutos militares, igrejas e conventos que os templários foram construindo ao longo do Caminho Francês de Santiago, destacando-se dos demais Santa Maria de Eunate (célebre a sua igreja pentagonal, inundada de simbologia), na rota jacobeia conhecida como Caminho Aragonês (ultrapassa a fronteira entre França e o antigo reino de Navarra no Porto de Somport) e o tremendo castelo de Ponferrada (conhecido pelas suas 12 torres e a sua relação com os signos do Zodíaco), na atual comunidade de Castilla-Leon, a escassos quilómetros da fronteira com a Galiza.
Garantida a proteção dos caminhos a norte da península em direção à tumba do Apóstolo Santiago, havia que assegurar a defesa dos territórios cristãos ao sul, precisamente na linha física que separava os reinos da cruz das terras muçulmanas, o rio Tejo.
É neste contexto que entra em cena uma personagem fundamental para a consolidação do novo reino de Portugal: Gualdim Pais.
Desde sempre fiel companheiro de D. Afonso Henriques, esteve com o primeiro rei na Batalha de Ourique, onde terá sido ordenado cavaleiro pelo soberano, antes de rumar para a Terra Santa e aí entrar nas fileiras do Templo, alcançando grande prestígio durante a batalha do cerco de Jafa (porto onde mais de mil anos antes os restos mortais do Apóstolo Santiago haveriam de embarcar rumo às costas galegas).
Ao regressar a Portugal, cinco anos depois, Gualdim Pais foi ordenado grão-mestre do Templo, àquela época sediada em Soure. Logo tratou em assegurar a defesa do reino, ao planear o desenvolvimento de uma linha de proteção, servindo-se para isso do rio Tejo como fronteira face aos territórios em poder dos fiéis de Maomé, empreendendo a construção de castelos que utilizassem as mais modernas técnicas no desenvolvimento de estruturas de proteção e defesa como, por exemplo, o alambor (também conhecido como talude, estrutura de pedra construída na base das muralhas, com o objetivo de impedir as torres de assalto de alcançar o pano das mesmas).
Fotografia | Castelo de Tomar - Autor Oren Rozen
Tomar foi o mais famoso de todos esses castelos que os templários construíram e que ainda hoje luz como farol de um passado glorioso. Erguido em 1162 na margem do rio Nabão, visou proteger a então capital do reino, Coimbra, das investidas mouras, para além de servir como nova sede da ordem, ao mesmo tempo em que à volta da fortaleza se desenvolvia uma localidade que viria a obter foral, nesse mesmo ano, precisamente pelas mãos de Gualdim Pais. Data também dessa época, o convento de Cristo, famoso pela extraordinária charola e, mais tarde, pela chamada janela do Capítulo, uma das obras escultórias mais impressionantes do gótico manuelino.
Fotografia | Charola do Convento de Cristo em Tomar - Autor, Vitor Oliveira
Classificado como património da Humanidade em 1983, a fortaleza conserva de uma forma impressionante tanto as características arquitetónicas e militares como a áurea misteriosa dos cavaleiros do templo. Muitos acreditam que no chão abaixo da charola do convento poderá estar escondido o grande tesouro templário, de que faria parte o Santo Graal, o cálice que Jesus terá usado na última ceia e que José de Arimateia terá utilizado para colher as últimas gotas de sangue de Cristo na cruz, aquando do desferimento da quinta chaga pelo legionário Longinus. Os adeptos das teorias pró e contra da história templária defendem que o nome de Portugal virá precisamente do facto de Tomar se ter tornado, às mãos de Gualdim Pais (ou quem sabe de D. Dinis ou mesmo de D. João, mestre de Avis) o “Porto do Graal”.
Será difícil ao peregrino despegar-se de tanta simbologia e filosofia templária na hora de abandonar Tomar, desta feita em direção a Alvaiázere, porque ainda falta muito para alcançar o Porto, cidade onde irá escolher um dos três caminhos para Santiago de Compostela.
Fotografia de capa | Draft World Magazine
Lê toda a rubrica |
Capítulo I – Entre a história e a Tradição, um nome para a eternidade
Capítulo II – Antes do Caminho de Santiago, o Caminho pré-cristão
Capítulo III – Fernando I de Leão, o primeiro peregrino do Caminho Português
Capítulo IV - Os Caminhos Portugueses a Santiago
Capítulo V – Rota do Património da Costa Atlântica Portuguesa
Capítulo VI – Da Capital do Gótico ao Reduto dos Templários
Capítulo VIII – O Tesouro da Rainha Santa na cidade dos Estudantes
Capítulo IX – Em Santiago para Agradecer o Milagre das Rosas
Capítulo X – O Caminho na rota da Gastronomia
Capítulo XI - O Caminho passa pela Rua Colorida
Capítulo XII - O Caminho Ganha Nova Dimensão
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