O Mistério do "Lago dos Esqueletos" na Índia
Foi desvendado o Mistério dos Himalaias?
Hoje vou levar-vos até à Índia, um destino com uma mística exótica, repleto de cores, aromas e sabores, considerado o sétimo maior país do mundo em tamanho e o segundo em termos de população. Um país sul Asiático que se estende desde os Himalaias até ao oceano Índico. São diversos os atributos deste gigante mundial, podíamos falar de uma cultura milenar, de religião e castas ou mesmo de uma gastronomia ímpar. Estava à espera daquele característico odor a caril? Ao invés de uma iguaria, hoje perseguimos um bom mistério.
O GPS leva-nos para o estado de Utaracanda, que a nordeste faz fronteira com a China e a sudeste com o Nepal.
Apesar de já haver relatos desde o final do século IX, esta história começa em 1942, no maciço de Trishul, quando o guarda florestal Hari Kishan Madhwal, ao passar por um vale na reserva de caça Nanda Devi, encontra um lago glaciar com ossos humanos a emergirem do gelo, restos mortais de centenas de indivíduos. A partir deste momento, o lago Roopkund com cerca de 40 metros de diâmetro, localizado a 5 mil metros de altitude nos Himalaias, passa a ser conhecido como o lago dos esqueletos.
Por esta altura, a Índia era uma colónia Britânica, as autoridades imperiais perante esta descoberta, colocaram a hipótese de que os esqueletos encontrados pudessem ser de vítimas de uma invasão Japonesa, não podemos esquecer que nessa altura estava em curso a segunda guerra mundial, hipótese esta que foi rapidamente descartada pelo facto de os ossos serem demasiado antigos.
Também foram encontradas no mesmo local, pontas de lanças de metal, chinelos de couro, anéis e artefactos de madeira. Dada a localização e clima da zona, apesar das águas claras, só se conseguem ver os esqueletos quando o lago não está gelado, ou seja, entre setembro e outubro. Uma pequena janela de oportunidade que tem um mês de duração.
Reza a lenda local que a presença destas ossadas deriva de uma peregrinação a um santuário próximo da deusa da montanha, Nanda Devi, realizada por um rei, a rainha e a sua comitiva de empregados, que, devido ao seu comportamento inadequado e comemorativo, foram abatidos pela ira da deusa.
O que aconteceu neste local?
É a pergunta que os investigadores têm tentado dar resposta.
Ao longo dos anos, têm aparecido várias teorias para explicar as origens destes ossos, podiam ser os restos mortais de um exército, ou de um grupo de mercadores que foi apanhado no meio de uma tempestade, ou mesmo vitimas de uma epidemia. Enfim, qualquer uma destas teorias tem o dom de preencher o imaginário do leitor, facilmente conseguimos imaginar como possível qualquer um destes cenários.
Uma pesquisa antropológica elaborada nos primeiros anos de século XXI estudou cinco esqueletos e estimou que tivessem 1.200 anos. Com base nos fragmentos de ADN também foi sugerido que havia dois grupos diferentes de pessoas, um intimamente relacionado (uma família ou tribo) e um segundo grupo com menos elementos e de indivíduos de menor estatura. Foi determinado que todos os corpos apresentavam danos na cabeça e nos ombros, o que levou os especialistas a sugerir que o ataque tinha vindo de cima. Então, prevaleceu a teoria que estes indivíduos tinham morrido devido a uma violenta tempestade de granizo. Mas uma nova análise genética realizada por um grupo de cientistas da Índia, América e Alemanha veio refutar essa hipótese.
Até 2019 pouco se sabia sobre a origem destes esqueletos, pois nunca tinham sido submetidos a uma investigação arqueológica sistemática devido à natureza perturbada do local, seja pelos deslizamentos de terra ou pelas frequentes visitas de peregrinos e montanhistas que tem vindo a manipular e remover artefactos.
Este novo estudo liderado por Éadaoin Harney e David Reich, aplicou uma série de pesquisas bioarqueológicas às ossadas de 38 indivíduos, nomeadamente análise de ADN, reconstrução dietética com isótopos estáveis, datação por carbono e análises osteológicas de saúde e de estatura. Conseguiram identificar 23 homens e 15 mulheres, incluíam crianças e idosos, parentalmente não relacionados. Os resultados indicam que os esqueletos de Roopkund pertencem a três grupos geneticamente distintos: 23 sul-asiáticos (depositados no lago entre os séculos VII e X), um do Leste Asiático e 14 do Mediterrâneo Oriental (depositados entre os séculos XVII e XX). Ou seja, não houve apenas um despejo de mortos em massa, como se pensava, mas vários, separados no tempo ao longo de mil anos.
Os indivíduos estudados eram saudáveis, apenas três deles apresentavam fraturas por compressão não cicatrizadas e foram encontrados alguns indivíduos altos e robustos que não se enquadram nos parâmetros da população sul Asiática. Também se percebeu que os indivíduos tinham dietas significativamente diferentes, o que reforça a o fato de representarem diferentes populações.
É aceitável a ideia de que um grupo de Indianos possa ter morrido durante uma peregrinação na zona, mas é menos provável que o mesmo tenha acontecido aos indivíduos com ascendência no mediterrâneo oriental, a cerca de 7 mil quilómetros de distância do seu local de origem.
Talvez alguns dos esqueletos tenham sido propositadamente trazidos para este lago com a finalidade se realizar cerimónias fúnebres, ou talvez fossem turistas ou exploradores mortos pela própria curiosidade!
É verdade que a ciência ajuda bastante na tentativa de resolução deste mistério, mas não é menos verdade que neste momento existem mais perguntas do que respostas, deixando um ótimo espaço para ser preenchido pelas mentes mais imaginativas.
O leitor continua atento, é sinal que consegui cumprir a promessa de apresentar-lhe um bom mistério, juntar os três ingredientes mágicos: insólito, antigo e ciência, originando um cativante aroma a mistério.
Para além de ser o maior produtor de leite do mundo, o país inventor do champô, onde a maioria da população não usa papel higiénico, a Índia é também berço de um dos maiores e mais antigos mistérios de sempre.
Seja bem-vindo ao lago dos esqueletos!
Pesquisa | BRSP