Hiato Temporal: Jesus e os Manuscritos
Uma das coisas que mais diverte os conhecedores da história do Cristianismo é ouvir dizer que o período cronológico que medeia, por um lado, entre a vida de Jesus de Nazaré e, por outro lado, os primeiros manuscritos de que dispomos sobre os eventos dessa vida que é demasiado amplo para que se possa dar credibilidade ao presente nesses textos e porções de textos.
Diverte, sim. Mas, por outro lado, entristece. E entristece por dois motivos: primeiro, porque quem diz isso, com conhecimento de causa, geralmente sabe o que direi, revelando uma preconceituosa atitude científica e humanamente deslocada; segundo, quem ouve isso, sem ser conhecedor da verdade, geralmente fica com uma ideia distorcida – quiçá o intencionado pelas pessoas aludidas no primeiro motivo.
Para se compreender melhor o que está em causa creio que o melhor será fazer uma comparação entre o referido temporal hiato entre Jesus e manuscritos sobre Ele e o período que existe entre outras figuras da Antiguidade. Sejam estas figuras anteriores, “contemporâneas” ou pouco posteriores a Jesus. Claro que esta é uma opção discutível, pois só apontarei algumas personagens históricas mais célebres e por mim conhecidas fruto dos meus estudos, nada parciais, a este respeito. Deste modo, não posso negar que haja exemplos com arcos temporais menores, mas garanto que os desconheço.
Comecemos por dar atenção à data da vida de Aristóteles e à data do primeiro manuscrito que possuímos sobre alguma obra sua. Este filósofo viveu no séc. IV a.C.— tendo sido tutor, por exemplo, de Alexandre Magno. Pois bem, o mais antigo texto copiado de algum dos seus textos data do séc. XII d.C. Ou seja: estamos ante um intervalo de cerca de 1400 anos. A respeito de Cícero (c. 106-43 a.C.), o referido hiato é de sensivelmente 1000 anos, podendo-se dizer com todo o rigor que o mesmo se passa com Júlio Cesar (c. 100-44 a.C.).
Para pessoas mais próximas de Jesus (c. 5 a.C.-30 d.C.), temos o caso de Fílon de Alexandria (c. 25 a.C.-50 d.C.), Séneca (c. 4 a.C-65 d.C.), Flávio Josefo (c. 37-100 d.C.) e Tácito (c. 56-120 d.C.), que nos levam, respetivamente, para diferenças temporais, entre as suas vidas e as porções de manuscritos dos seus textos mais próximos das suas vidas, de: 250 anos; 800 anos; 1000 anos e, por fim, 700 anos respetivamente.
Já o mais antigo fragmento daquilo que hoje se chama Novo Testamento (o Papiro Raylands) é, se quisermos ser conservadores, de cerca do ano de 150 d.C. (embora nada me convença que não seja 40 anos mais velho), tendo nós todos os textos completos desse Novo Testamento (aceite hoje por todas as confissões cristãs históricas como contendo 27 livros) a meados do séc. IV d.C. Ou seja, e mantendo-se a mencionada posição conservadora: um intervalo cronológico de 120 e 300 anos.
Em suma: “o hiato entre Jesus e os manuscritos sobre Ele” não fica a perder em pequenez face aos exemplos apresentados. Donde surge a questão: qual o motivo do supracitado deslocamento científico e humano? No mínimo, e na minha opinião, uma discriminação negativa face a Jesus e ao Cristianismo, quiçá fruto de outros prejuízos históricos relacionados com mitos conectados com a fé cristã (que tentarei ir apontando).
Imagem de Evgeny Kulakov por Pixabay
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