Vida: Comportamento e Mudança
Padrões enrijecidos: quando o comportamento está desalinhado com a vida.
Mudar comportamentos que nos incomodam e persistem, talvez seja a tarefa mais desejada, mas também a mais temida e por vezes hercúlea a encetar por cada um de nós. Todos temos condutas que persistem, quando vão no sentido da saúde, não causam problemas, pois nem tudo o que persiste, resiste, e pode ser apenas um hábito benéfico e saudável. As condutas na sua essência são o destino do nosso comportamento.
O problema surge quando as condutas se enrijecem numa persistência que nos incomoda. Quando assim é, são reflexos de resistências, de medos, de temores e ansiedades, aí sim, são um travão no curso da vida.
Por vezes a conduta humana resulta de necessidades emocionais e afetivas que não são satisfeitas, quando assim é deriva de algo que ficou travado, de algo que ficou desalinhado com o fluxo da necessidade e do desejo. Nesse caso a conduta vai em contramão do necessário, em desalinho com as exigências dos acontecimentos de vida e em recusa do pedido íntimo de cada um. Ou seja, algo persiste no lugar errado.
Quando pensamos em mudar padrões de comportamento, pensamos em como passar da culpa ao perdão, da tristeza à alegria, da negação à afirmação daquilo que nos é único, original e singular.
No caso do perdão, perdoar é poder seguir, sem ter a necessidade de estar sempre a voltar lá atrás, sem estar sempre a voltar ao lugar da mágoa. Perdoar é poder de algum modo aliviar a dor.
Trata-se de uma dor que precisa de lugar, que precisa de relação e escuta. Como defende o psicanalista Jaime Milheiro:
“As dores não têm algoritmos, nem computadores. Têm expressão e necessidade de expressão sejam quais forem as suas origens e as suas potencialidades de tratamento.”
Perdoar é poder dizer a dor da mágoa, é poder dizer a dor do trauma. É não ficar aquém, é dizê-la para a partir daí poder criar a sua narrativa, e desse modo ampliar o seu sentido e significado, possibilitando assim a mudança necessária que nos permite ir além da dor.
Neste caso, mudar é seguir com a vida, sem ressentir em demasia, ou seja, sem tornar a sentir o que magoou, o que desanimou, o que frustrou. Mudar é seguir sem tornar a sentir tudo numa repetição compulsiva.
Mudar é prosseguir, é dar seguimento. Não como fuga, mas como ritmo próprio de uma mudança que se quer no seu tempo e ao seu tempo.
Quando pensamos em mudar padrões de comportamento e suas condutas, pensamos em como entender uma emoção, e como isso poderá ajudar a compreender o que sentimos, o que experimentamos, o que vivemos.
Neste sentido, e como temos vindo a dizer anteriormente, é importante colocar em palavras o que sentimos. Pois não há nada que angustie mais do que uma angústia sem nome. Muitas vezes existe uma grande dificuldade em identificar o que se sente, ou em discriminar emoções sentidas sem as confundir com outros estados afetivos.
Quando procuramos descrever o que sentimos, o que se passa, isso pode ajudar-nos a descobrir com mais clareza o que está a acontecer. Esse processo ganha mais força quando temos alguém que o escute, que o acolha, que o contenha. Em regra, quando reprimimos o que sentimos, ao controlo inicial segue-se o descontrolo.
A proposta que aqui vos apresento não é dar espaço em demasia ao negativo e continuar na queixa ou na raiva. Não é a partir do lugar que persiste na queixa e na raiva, que nos transformamos (dar outra forma), mas a partir de um lugar de compaixão necessário para acompanhar a mudança que se exige, e que nos exige.
Se existisse uma máxima para estas situações seria: não negar o que acontece, respeitar o lugar de vida, não ampliar a situação.
Não negar o que acontece é poder viver o que nos é dado a viver, mas também poder ir além. Não permanecer fora do lugar de vida e não ampliar estados afetivos e emocionais. Claro que este movimento de vida e de aceitação só pode resultar de um processo de aprendizagem com e na experiência de vida. O que implica necessariamente uma abertura para que tal se realize. Como defende a psicóloga Isabel Empis:
“É necessário usar o que se aprendeu a partir do que se é”.
Na vida cada encontro pessoal e cada circunstância nova oferece-nos a possibilidade de obtermos uma perceção diferente da realidade vivida, com o enriquecimento do que daí decorre, nomeadamente, no desdobramento da situação e contexto de vida. Em suma, é poder viver a contemplação com a posterior afirmação e concretização das novas possibilidades (ajustes criativos) que se apresentam diante de nós.
A vida precisa de fluir. Assim como a retenção de água no organismo causa problemas à saúde, a retenção de valores, ideias, conceitos, sentimentos negativos, apegos e ilusões, também provocam danos para a nossa saúde psicológica. Na vida necessitamos de uma postura de algum desapego, porque tudo é mutável e impermanente.
A flexibilidade é a capacidade de nos adaptarmos às circunstâncias da vida, o que significa não ter posturas rígidas em termos físicos ou psíquicos. Uma pessoa rígida não vive, está de algum modo “morta”. Flexibilidade é antes demais sinal de vida.
A propósito da flexibilidade, e para terminar, recordamos o exemplo do bambu, a partir do qual podemos deduzir ideias e práticas que podemos aplicar ao nosso quotidiano, ora vejamos. O bambu tem uma maneira peculiar de brotar e crescer que chamou a atenção dos chineses e restantes mestres orientais, e que se tornou uma grande lição de sabedoria. A semente, depois de colocada no solo, demora muito tempo para apresentar sinais externos de que vai vingar.
No início a semente transforma-se num bulho e só depois de algum tempo é que surge um pequeno broto. Este broto permanece inalterado sob o solo por um longo período de tempo. Somente depois de as raízes atingirem dezenas de metros, ao longo de cinco anos de incessante trabalho, é que o broto começa a projetar-se para fora da superfície.
A partir desse momento, o bambu cresce vertiginosamente podendo atingir a espantosa altura de 25 metros! Ao observar o comportamento do bambu, os mestres chineses aprenderam a importância da paciência e da determinação. Isso aplica-se à mudança de padrões de comportamento. Muitas vezes queremos que as coisas aconteçam rapidamente e ficamos impacientes perante a demora dos resultados.
Se a preocupação for mostrar e atingir resultados imediatos, corre o risco de sacrificar as bases e os alicerces, e desta forma, pode colocar tudo a perder.
Texto e Fotografia | Vítor Fragoso - Psicólogo Clínico e Psicoterapeuta
Sugestões de leitura |
Empis, I. (2013). Ousar Ser – a solução está mesmo dentro de nós. Oficina.
Milheiro, J. (2021). Ensaio sobre os Humanos. Edições Universidade Fernando Pessoa.
Otsu, R. (2006). A sabedoria da natureza: taoísmo, I Ching, Zen e os ensinamentos essênios. Editora Agora.
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