Marx: a Revolução e o Ateísmo
Marx: a Revolução e o Ateísmo

Marx: a Revolução e o Ateísmo

Creio que poucas pessoas ignorarão Karl Marx, mas será que a ideologia que adquiriu nome a partir do mesmo é tão conhecida quão devia? É certo que o marxismo, apesar da sua proposta ser assaz débil, é uma realidade muitíssimo presente nos nossos dias. Talvez já não na sua pureza inicial, mas na dos seus epígonos culturais provindos, por exemplo, de Antonio Gramsci e do círculo de pensadores que formaram a Escola de Frankfurt. Mas regressemos a Marx.

No seu “Manifesto do partido comunista”. Marx fala, logo no seu início, do “espetro do comunismo” que deveria expandir-se, de revolução violenta em revolução violenta, sobre todo o Mundo. Para ele, toda a (filosofia da) história reduz-se, numa perspetiva mais atroz do que a do próprio Maquiavel, à luta de classes entre: “opressores” e “oprimidos”. Em consequência disto, o amor, a bondade, o altruísmo e a generosidade são totalmente negados ou ignorados, sendo afirmado que a competição e a exploração são a regra geral da humanidade.

Isso, contudo, pode mudar se se vir que, no fundo, a sociedade não tem muitas “classes”, mas apenas duas: a “burguesia” exploradora e o “proletariado” explorado. As palavras, perante isto e para Marx, não servem para provar que o comunismo tem razão, mas para encorajar o ódio do proletariado face aos burgueses, de modo a que os membros daquele queiram espoletar a revolução (do proletariado), que imporá, por fim, a verdade do comunismo como uma evidência: «na história, nada se consegue sem violência e brutalidade implacável» (Marx, citado por Edmund SILBERNER, The Problem of War, p. 266).

Para que isto ocorra, é preciso retirar o “povo” do jugo da “religião” (leia-se: sobretudo o Cristianismo, pois as religiões belicistas sempre foram tidas como um aliado natural do marxismo). Uma religião que, segundo o sempre pragmatista Marx, opiava ou narcotizava tal “povo”, colocando-o num estado de aceitação da paz, da mansidão, da benignidade intersocial que o impedia de querer revoltar-se violentamente contra o “status quo” da sociedade.

No fundo, e de acordo com um Marx que nunca se libertou do hegelianismo associado a um darwinismo transferido das “espécies” para a “humanidade”, só se aniquilando a religião é que poderá surgir a necessária revolta violenta (do proletariado) que poderá inverter a realidade existente. Para isso, os “fracos” (os trabalhadores) devem ser sacrificados para, lutando contra os mais “fortes” (os capitalistas”) e derrotando-os, os dirigentes políticos marxistas (algumas vezes ditos pelo termo “nomenklatura”) tomarem o poder e, como sempre se viu no séc. XX, reivindicarem para si os privilégios dos capitalistas (associados, agora, a um pendor ditatorial).

Na base disto tudo também está o seu ateísmo materialista, decorrente de dois elementos matriciais nada sólidos ou ponderados. Em primeiro lugar, o seu ateísmo juvenil, decorrente de ter rejeitado a figura do seu pai, um pastor Luterano. Depois, o facto de, apesar de ter cortejado hipocritamente teólogos radicais como Bauer e Friedrich Strauss, não ter conseguido um cargo académico nas Universidades Alemãs.

Imensamente revoltado contra a religião – em especial devido a este último aspeto (que lhe impôs a condição de emigrante) e desejoso de que os demais se desprendessem dela para imporem a sua ideologia – Marx sustenta que toda a existência é apenas matéria, sem lugar algum para o espiritual. E isto, inclusive a nível do pensamento (algo que, desde logo é insustentável, pois, se assim fosse, nunca alguém, entregue ao movimento caótico da matéria constituinte do seu cérebro, seria capaz de entender outra pessoa cujo cérebro era movido de uma forma igualmente arbitrária).

De qualquer modo, pressupondo-se isto, é linear compreender que, para este pensador, toda a compreensão da realidade de um dado sujeito depende da dimensão material, expressa a nível social e económico (o terrível reducionismo económico marxista), em que o mesmo vive. Surge aqui mais uma “prova” da verdade do “seu” ateísmo, já anteriormente assumido por Marx por desprezar o pai e sentir-se desprezado, e acabando por ser por ele desejado como realidade universal para se implementar, em todo o Mundo, a sociedade comunista.

Deus, assim e para Marx, não é senão um esforço humano para o sujeito tentar libertar-se das, ou pelo menos suportar as, dificuldades da vida. Para se instilar no proletariado a vontade de se revoltar violentamente não basta, portanto, acabar com a religião, mas com o próprio Deus, entendido como uma simples projeção social alienada das inquietações humanas.

Deus e a religião são, então, os “inimigos a abater”, para que, acabando-se com o mundo de sonhos por si sustentados, se possa instituir, pela revolução, um “novo homem” e uma “nova sociedade”. Uma em que não haja, a nível económico, propriedade privada (uma que, por sinal, é fundamental para a dignidade humana); o fatalismo historicista e o cientismo materialista sejam dominantes a nível intelectual e académico; e, enfim, o estatismo secularista e militarista como meio de controlo totalitário dos comportamentos sociais.

A respeito das críticas filosófico e/ou religiosas que lhe iam sendo apontadas, acerca deste estado de coisas por si utopicamente sonhado, Marx “varria-as para o lado” com as seguintes palavras (características de quem não tem argumentos válidos): «as acusações contra o comunismo feitas do ponto de vista religioso, filosófico e, em geral, ideológico, não merecem um mínimo de atenção» (Marx, citado por David GRUNWALD, Why Communism Failed, p. 39).

Em tudo o que vimos Marx estava, pelo menos em parte, tremendamente errado. Mas há quem persista em endeusá-lo e em seguir cegamente as suas teorias, em alguns aspetos genuinamente desumanas. Não é acaso que os regimes comunistas ateus tenham causado, só no séc. XX, mais de 150.000.000 de mortos. Terá sido por algum presságio disto que, quando o seu cadáver foi inumado, só uma dúzia de pessoas tenha estado presente?

Não se pode, manifestamente, afirmar o sugerido no fim do parágrafo anterior, sendo a realidade acerca desse facto muito mais prosaica: Marx, afora um grupo mínimo de simpatizantes (exploradores dele e explorados por si), foi uma pessoa que muitos, no seu tempo, consideravam nefanda. Na realidade, Marx foi um libidinoso adúltero inveterado que acarretou a dor e a infelicidade à sua família, às mulheres (pobres, por sinal) que cortejou e a quem (dada a sua superioridade social) até obrigou a terem filhos ilegítimos, que recusava ver.

A sua personalidade era, no fundo, um espelho dos regimes que a sua ideologia inspirou: cruel, indelicada, indecente, autoritária e hipócrita. Mas não só: este pensador era humanamente decadente, higienicamente sórdido e imensamente racista, sobretudo a respeito dos judeus, africanos e indianos, acerca dos quais afirmou que eram «indignos, estagnados e subsistindo numa vida vegetativa» (Marx, citado por Derek SAYER, Capitalism and Modernity, p. 8).

Apesar de nos convidar a olhar, de frente, para todas as formas de escravidão e para a idolatria da riqueza, Marx sofreu, fez sofrer, e continua a fazer sofrer em consequência da sua “húbris” ateia. Uma que o levou a crer que, apesar de ter sido um péssimo economista, poderia prever infalivelmente um futuro, onde, naturalmente, a liberdade, a humildade, a benevolência, a tolerância e a compaixão não poderiam subsistir.


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