Ovos Moles: o património mais doce de Aveiro

Ovos Moles: o património mais doce de Aveiro

Os Ovos-moles de Aveiro são uma especialidade da doçaria conventual portuguesa. Produto das gemas que ficavam dos ovos, cujas claras eram usadas para engomar a roupa e produzir hóstias, os Ovos-moles tornaram-se a face mais doce do património cultural aveirense.

Esta iguaria é composta essencialmente por gemas de ovo e açúcar, envoltas numa fina camada de massa à base de farinha de trigo, cuja forma remete a diversos elementos marítimos, como conchas e peixes, em alusão à forte ligação da cidade com a Ria de Aveiro.

A origem dos Ovos-moles de Aveiro remonta ao século XVI, estando intrinsecamente ligada à vida monástica e conventual da época. Com a extinção das ordens religiosas em Portugal no século XIX, muitas das receitas desenvolvidas nos conventos foram levadas para fora dos seus muros por antigos membros da comunidade ou por trabalhadores que lá atuavam.

As freiras dos vários conventos de Aveiro, como o Mosteiro de Jesus, dedicavam-se à produção de hóstias para a Eucaristia, utilizando para tal grandes quantidades de claras de ovos, para conferir firmeza à massa.

A história dos Ovos-moles de Aveiro está enraizada nas práticas conventuais que moldaram não só a gastronomia, mas também o quotidiano e as soluções criativas para o aproveitamento de recursos nas comunidades religiosas de Portugal.

A prática de utilizar as claras de ovos para engomar roupa, em especial os hábitos e as vestimentas litúrgicas, reflete bem a economia circular que caracterizava a vida nos conventos. Com a abundância de gemas resultante, as freiras viram-se na posse de um ingrediente que precisava ser valorizado, evitando o desperdício. A doçaria conventual, na qual os Ovos-moles de Aveiro se destacam, emerge assim não apenas como expressão de criatividade culinária, mas também de uma necessidade prática.

O açúcar, cujo comércio estava a crescer na época da expansão ultramarina, devido a territórios descobertos e colonizados como a Ilha da Madeira, tornou-se um ingrediente fundamental na criação destes doces. A “Pérola do Atlântico”, aliás, era um ponto fulcral na rota do açúcar que ligava o nosso país às suas colónias, e o acesso a este produto permitiu a inovação nas receitas conventuais.

O processo de produção dos Ovos-moles envolvia a delicada mistura de gemas com açúcar, adicionando-se água para ajustar a consistência. A massa resultante, rica e cremosa, era então cuidadosamente colocada entre duas finas camadas de hóstias, moldadas frequentemente em formas alusivas à vida marítima, em homenagem à proximidade da Ria de Aveiro.

Este método não apenas transformava ingredientes simples em algo extraordinariamente saboroso, mas também espelhava uma dimensão de fé e devoção das comunidades religiosas onde estas iguarias floresciam. A ligação dos doces à espiritualidade e ao sagrado era evidente, não só pela sua origem nos espaços conventuais, mas também pelo seu papel nas festividades e cerimónias litúrgicas.

Como já mencionei, o desenho em forma de concha não foi de todo inocente, com o objetivo do mesmo a exultar a cultura aveirense e a sua relação com o mar, tornando-se uma marca distintiva dos Ovos-moles e da cidade onde desagua o rio Vouga.

Os Ovos-moles começaram, logo após a extinção das ordens religiosas, a ser produzidos por doceiras locais, que mantiveram a tradição e os segredos da receita, passando-os de geração em geração.

Com o passar dos séculos, os Ovos-moles de Aveiro transcendem o contexto da sua criação, mantendo-se uma parte vital da identidade cultural e gastronómica de Aveiro e de Portugal.

A receita, preservada através de gerações, não apenas sobreviveu ao fim das comunidades hieráticas, no século XIX, mas também prosperou, tornando-se um símbolo de tradição, inovação e qualidade na doçaria portuguesa.

Os Ovos-moles de Aveiro são hoje reconhecidos como uma das principais especialidades da doçaria portuguesa, tendo sido um dos primeiros produtos em Portugal a receber a Indicação Geográfica Protegida (IGP), em 2008.


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