As Origens Históricas do Conflito entre a China e Taiwan
A visita da presidente do Congresso dos Estados Unidos, Nancy Pelosi, veio agudizar as relações entre dois territórios unidos por laços históricos e culturais, conhecendo a primeira rutura em 1912 e que desde então experienciou altos e baixos no diálogo diplomático entre as “duas Chinas”.
A ilha de Taiwan, oficialmente conhecida como República da China, é uma ilha separada da China pelo Estreito de Taiwan.
Achada, em 1542, pelos portugueses que a batizaram como Ilha Formosa, os seus primeiros assentamentos populacionais datam de há mais de 20 mil anos. Ancestrais dos povos indígenas estabeleceram-se na ilha há cerca de seis mil anos. Mas é apenas no século XVII que as relações com o “Império do Meio” conhecem a sua primeira página, com a imigração chinesa em larga escala para o oeste de Taiwan, numa altura em que a ilha era controlada pelos holandeses e continuou quando, em 1661, surgiu no sudoeste do território, o Reino de Tungning.
A ilha foi anexada em 1683 pela dinastia Qing e cedida ao Japão em 1895. A República da China, que derrubou os Qing em 1911 (depondo Pu Yi, o último imperador), assumiu o controlo de Taiwan em nome dos aliados, na Segunda Guerra Mundial, após a rendição nipónica, pouco tempo depois do bombardeamento atómico à cidade de Hiroshima, ocorrido a seis de agosto de 1945.
Entre 1927 e 1937 (interrompida pela invasão japonesa), o país mergulhou numa guerra civil, impulsionada pelos movimentos comunistas contra o governo, naquela época controlado pelo Partido Nacional do Povo, o Kuomintang, partido nacionalista que teve como membro mais proeminente o general Chiang Kai-Shek. Conheceu novo conflito interno a partir de 1946 na derrota do Kuomintang para as forças do Partido Comunista, liderado por Mao Tse-Tung e consequente fuga do então presidente Chiang Kai-Shek e do restante governo para Taiwan, em 1949. Taipé tornar-se-ia a capital da República da China, enquanto, em Pequim, era proclamada a República Popular da China.
Chiang Kai-Shek manteve-se no poder até 1971. A partir desse ano, o regime político haveria de evoluir para um sistema democrático, sobretudo no período de vigência de Lee Teng-Hui (ainda hoje reconhecido como o “pai da democracia de Taiwan”), com a indústria da ilha a evoluir rapidamente, até se tornar um dos territórios mais desenvolvidos da Ásia, atualmente habitado por cerca de 25 milhões de pessoas, cotando-se como a 13ª maior economia do mundo e o 17º maior exportador (dados de 2020).
Contudo, por essa altura, já as Nações Unidas e grande parte das principais potências deixaram de reconhecer Taiwan como a legítima interlocutora da China no concerto das nações e, em 1978, o presidente norte-americano Jimmy Carter anuncia que a representação diplomática dos Estados Unidos passaria para o continente, numa clara alusão à soberania da República Popular como representante oficial da China no contexto internacional.
As relações sino-taiwanesas conheceram um período de relativa paz a partir de 1980, quando Pequim e Taipei alcançam um acordo que permitiria a entrada conjunta de cidadãos e de empresas numa flexibilização das regras alfandegárias e de investimentos. Em 1991 Lee Teng-Hui assumiria formalmente o fim do conflito com a República Popular da China.
Tal declaração não terminou com a intenção de Pequim em anexar a ilha. A China propôs a chamada opção "um país, dois sistemas", que, segundo o poder comunista, daria a Taiwan uma autonomia significativa se concordasse em ficar sob o controlo do Congresso Nacional do Povo, à semelhança de Macau e de Hong-Kong. A proposta foi recusada liminarmente, sobretudo a partir do momento em que sobe ao poder, no ano 2000, o presidente Chen Shui-Bian, político avesso às pretensões chinesas, provocando o alarme do Comité Central. O conflito ganharia mais contornos a partir de 2004, ano em que Pequim aprovou a chamada “lei anti-secessão”, afirmando o direito de Pequim em usar "meios não pacíficos" contra Taiwan se esta tentasse "separar-se" da China, uma retórica que se intensificou também no plano económico quando, em 2018, Xi Jinping intensificou a pressão sobre as empresas internacionais: se estas não listassem Taiwan como parte da China nos seus sítios na internet, estas poderiam ser proibidas de realizar negócios com o gigante asiático.
E é nesta equação conturbada que os Estados Unidos, influenciados pelos seus próprios interesses estratégicos e económicos, vê a balança pender, ora para o lado de Taipei, ora para Pequim. Se numa primeira fase Washington se viu obrigado a aceitar o regime comunista como legítimo defensor dos interesses do povo chinês na senda diplomática internacional, o mesmo apoio tem oscilado, à medida que Taiwan se afirma como um aliado privilegiado no extremo asiático, ao ponto de fornecer armas ao exército taiwanês para fazer face a uma possível invasão.
Em maio de 2022, o presidente Joe Biden, quando questionado se os EUA defenderiam Taiwan militarmente em caso de uma incursão chinesa, respondeu afirmativamente, declarações que seriam alteradas, “à posteriori”, pelos serviços diplomáticos da Casa Branca, esclarecendo que a posição americana sobre Taiwan não havia mudado, reiterando o compromisso com a política de "Uma China". Pouco tempo depois a administração Biden cairia novamente em contradição ao declarar total apoio militar a Taiwan.
Pequim condenou imediatamente o apoio público de Washington a Taipei, intensificando a sua presença militar tanto nas águas do Estreito de Taiwan como nos céus da ilha e que agora viu novamente reforçado no momento em que a “speaker” do congresso americano aterrou na Formosa.
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