Córdova: A Cidade das Três Culturas
No séc. X foi a maior cidade de Europa, com quase 90 mil habitantes. Farol de cultura e de ciência, Córdova representou o apogeu da cultura muçulmana, com a mesquita-catedral como símbolo do passado glorioso do Al-Andaluz.
Córdova, a cidade enigmática dos emires foi conhecida desde o séc. IX até ao séc. XIII (data da conquista da cidade por Fernando III de Leão e Castela) como a "cidade das três culturas". Nela conviveram pacificamente, durante mais de três séculos, árabes, cristãos e judeus.
As origens de Córdova estão perdidas nas névoas do tempo. A sua posição junto ao rio Guadalquivir e a terra cultivável fértil da campiña andaluz tornaram-na um lugar perfeito para os primeiros assentamentos pré-históricos.
Córdova é ainda hoje uma cidade com um enorme legado cultural e monumental. A sua localização estratégica, perto do Rio Guadalquivir é herança dos vários povos que vivem nas suas terras ricas, que a tornaram num lugar privilegiado. O rio, cujo nome tem origem na expressão árabe "Wad Al-Kabir" que quer dizer "Rio Grande, é o quinto maior rio da Península Ibérica e desde as ocupações populacionais primitivas que recuam a séc. VIII a.C. que representou uma privilegiada via de comunicação. Desagua no Oceano Atlântico num amplo estuário entre Almonte (Huelva) e Sanlucar de Barrameda (província de Cadiz), com o curso entre Sevilha e o estuário composto por uma grande área de pântanos, alguns destes inseridos na área protegida do parque nacional de Donana.
Legenda das fotografias no final do texto.
Após a chegada dos fenícios e dos gregos à península, a cidade tornou-se conhecida como um importante centro comercial e mineiro, já que o rio Guadalquivir era então navegável até Córdova, facilitando a propagação de produtos artísticos e comerciais e a comunicação com as principais cidades daquele tempo. Córdova teve um estatuto favorável sob a égide dos romanos. No tempo do imperador Otávio César Augusto (27 aC a 14 dC), foi a capital da província da Baetica e a maior cidade da Península Ibérica. Desse tempo resta ainda a ponte sobre o Guadalquivir, conhecida como a ponte de Calahorra.
Em 411, durante as invasões bárbaras da península Ibérica, a cidade foi saqueada e ocupada temporariamente pelos vândalos, com vários historiadores a defenderem a tese de que é do nome desse povo bárbaro que reside a origem da toponímia que identificou o reino muçulmano na antiga Hispania romana: Al-Andalus ou Al-Vandalus, a terra dos vândalos.
Durante o domínio visigótico, a cidade procurou manter suas instituições romanas, apelando para o imperador bizantino Justiniano, que ocupou a cidade em 550. Em 572, foi reconquistada pelo rei Leovigildo, num período em que Toledo concentrava as atenções como a capital do império visigótico.
Contudo, os maiores anos de glória de Córdoba, ocorreram entre 756 a 1031, quando se tornou a capital de Al-Andalus, emirado fundado pelo general berbere Tarique e dependente do califado Omíada de Damasco.
Foi durante este período que a Grande Mesquita foi construída, a primeira parte no século VIII e a quarta e última secção, no final do século X, com o seu crescimento progressivo a refletir a crescente importância de Córdova, que no século X tornar-se-ia somente a maior cidade da Europa, com as estimativas a apontarem para um número recorde de 90 mil habitantes, um número significativo quando nenhuma outra cidade na Europa (como Paris ou Londres) não alcançavam sequer a fasquia dos 50 mil.
Se ainda hoje é uma pérola do património (declarada como Património Mundial pela UNESCO em 1984, data em que a mesquita-catedral foi classificada, com o restante centro histórico a ser abrangido dez anos depois), a cidade deslumbrava na época da ocupação islâmica, com o seu ar civilizado e atividade multicultural, com muçulmanos, judeus e cristãos (chamados mozárabes) misturando-se a todos os níveis, convivendo de forma pacífica, à volta de interesses comuns, com destaque para a intensa atividade comercial. Contava com ruas pavimentadas, iluminação pública e villas luxuosas com saneamento e canalização interior (armários de água reais) ao longo das margens do Guadalquivir. Os pátios centrais das casas (reconhecidos pela sua beleza floral), os jardins e as fontes representavam um oásis refrescantes contra o calor do verão, e os banhos públicos mantinham o corpo purificado, com vida centrada na grande mesquita, famosa em toda a Europa pela sua beleza arquitetónica (onde sobressai o magnífico mihrab completamente decorado a ouro) mas também por albergar a grande biblioteca do califa Al-Hakam II composta por 400 mil volumes, num período em que a biblioteca mais importante da cristandade peninsular, o famoso mosteiro de Ripoli, na Catalunha não passava das “singelas” 192 mil obras”.
Quando, em 1236, Fernando III “o Santo” conquistou Córdova, logo tratou de transformar a antiga mesquita num templo católico, com as lanternas islâmicas a serem arrancadas das paredes e tetos da mesquita e a serem transportadas para Santiago de Compostela já que, como rezava a tradição, tinham sido produzidas com o bronze fundido a partir dos sinos da catedral compostelana, em resultado da destruição provocada por Almançor, em 997.
Mas se Córdova é famosa pelo seu património edificado, como a mesquita-catedral, a torre e ponte de Calahorra, o alcazár dos reis católicos, os moinhos islâmicos ao logo do rio ou o bairro judeu, a história e o prestígio que a cidade granjeou ao longo dos séculos deve-se também ao facto de ter sido o berço de personagens universais como o filósofo e estadista Séneca, o também filósofo muçulmano Averrois e um dos intelectuais judaicos mais importantes da Idade Média, o rabino, filósofo e médico Maimónides.
Armanda Barros
CONHEÇO CORDOVA mas não conhecia a sua história completa