A Conspiração da Pólvora e a Noite de Guy Fawkes

A Conspiração da Pólvora e a Noite de Guy Fawkes

Tentativa de Assassinato do rei Jaime I vira ritual anual no País de Sua Majestade

A Noite de Guy Fawkes

É um dos episódios mais bizarros da história de Londres e do Reino Unido. A tentativa de pôr fim à vida do rei Jaime I de Inglaterra e de toda a sua corte por um grupo de católicos radicais transforma-se num ritual comemorado todos os anos na capital britânica e um pouco por toda a nação a 5 de novembro, misturando tradições celtas com cultos que influenciariam a festa contemporânea do Halloween.

A Conspiração da Pólvora e a Noite de Guy Fawkes

Em 1605 um grupo de católicos ingleses liderados por Robert Catesby planearam uma tentativa de fazer explodir a Câmara dos Lordes do palácio de Westminster, com o objetivo de assassinar o rei Jaime I de Inglaterra (Jaime VI da Escócia), confesso monarca protestante e toda a sua corte e governo.

O plano era explodir a Câmara dos Lordes durante a State Opening do Parlamento a 5 de novembro de 1605, como o prelúdio de uma revolta popular em que buscavam colocar no trono a filha de Jaime I (na época com apenas 9 anos) e assim instaurar um reinado católico.

A conspiração foi organizada por Robert Catesby, num esforço para acabar com a perseguição de Católicos romanos (conhecidos como os recusant catholics) pelo governo inglês. Catesby e os seus aliados esperavam substituir o governo protestante do país por uma liderança católica. 

Tal era a obstinação demonstrada por Robert Catesby, tido como “personalidade de boas famílias e de alta educação”, em colocar um súbdito do papado no trono, que terá inclusivamente reunido, ainda no tempo da rainha Isabel I (a Rainha-Virgem) com o arqui-inimigo dos ingleses naquela época, nada mais, nada menos que Filipe III de Espanha, país ainda a contas com a terrível humilhação do episódio da Invencível Armada.

Em vão procurou apoio junto da corte hispânica, já que o católico monarca não se encontrava em condições para novo conflito com o lado de lá do Canal da Mancha.

Robert Catesby, que viu o seu pai ser perseguido precisamente pelo governo da rainha Isabel I por se recusar a prestar fidelidade à Igreja de Inglaterra, procurou, ao longo dos anos, elaborar um plano de vingança contra os protestantes.

Com a morte de Isabel I, que não deixou descendentes, subiu ao trono o filho de Maria, rainha dos Escoceses (que foi mandada executar precisamente por Isabel, sua prima), conhecido à época como Jaime Vi da Escócia e que se tornaria Jaime I de Inglaterra, impulsionando a união das duas coroas e, logo, dos dois reinos, o que de facto vira a acontecer, em 1707, com o Tratado da União.

Sabendo que o rei Jaime e toda a sua corte estariam no Palácio de Westminster para a abertura do ano parlamentar, em outubro de 1605 Catesby e um punhado de outros conspiradores alugaram um porão que se encontrava por debaixo da “House of Lords”, a câmara alta do parlamento de Londres.

A cerimónia da “State Opening of Parliament” viria a ser adiada para novembro devido a um surto de peste, dando a Catesby e seus correligionários (entre eles encontrava-se um tal de Guy Fawkes) tempo de sobra para encher os porões de explosivos suficientes para levar à cena o maior “espetáculo pirotécnico” que Londres alguma vez conheceria.

Tudo parecia correr bem ao grupo até que um dos católicos, supostamente Francis Tresham, terá redigido uma carta anónima a William Parker, 4º conde de Monteagle (um católico não assumido publicamente), que era seu amigo, alertando-o a “inventar uma desculpa” e assim ausentar-se do Palácio naquela data.

O conde de Monteagle logo avisou o então secretário principal do reino, Robert Cecil, 1º conde de Salisbury, um dos mais fervorosos anticatólicos do reino (o seu pai tinha sido secretário da rainha Isabel I e foi o responsável pela expulsão dos jesuítas e de centenas de padres de Inglaterra).

Na noite de 5 de novembro, um dos conspiradores, de seu nome Guy Fawkes, foi incumbido de fazer explodir os mais de 30 barris de pólvora que se encontravam armazenados por baixo de uma pilha de lenha e carvão, no subsolo do Parlamento. Quis o destino que a humidade sentida no subsolo do palácio, consequência da proximidade do rio Tamisa, levasse a que o pavio ficasse encharcado, impedindo a detonação da forte carga que, segundo rezam as crónicas, daria para destruir o palácio “vinte vezes”. Alertadas pela carta anónima, as autoridades vasculharam nessa mesma noite os porões do palácio, encontrando tanto a carga de explosivos como o malogrado Guy Fawkes.

Preso e torturado na torre de Londres, Guy Fawkes confessou o nome dos restantes conspiradores, juntamente com os mesmos foi condenado à morte por enforcamento, mas mais uma vez o destino fez das suas e ao invés de conhecer o seu fim pendurado na forca, morreu ao tropeçar na subida para o cadafalso, partindo o pescoço na queda.

Certo é que a história provocou uma nova tradição na cidade de Londres: a Noite de Guy Fawkes.

A partir de 1605 a cidade de Londres passou a festejar a tentativa falhada de assassinar o rei Jaime I e assim celebrar a vida do monarca com grandes fogueiras (as bonfires). Imediatamente após a prisão de Guy Fawkes a 5 de novembro de 1605, apanhado em flagrante no momento em que se preparava para detonar o depósito de explosivos sob a Câmara dos Lordes, o Conselho de James I permitiu que o público celebrasse a sobrevivência do rei com fogueiras, desde que festejassem "sem nenhum perigo ou desordem”. Em janeiro seguinte, dias antes de os conspiradores sobreviventes serem executados, o Parlamento aprovou a Lei de Observância de 5 de novembro, comummente conhecida como "Ato de Ação de Graças", proposto por um membro puritano do Parlamento, Edward Montagu, que sugeriu que a aparente salvação do rei por intervenção divina merecia um reconhecimento oficial.

A partir daqui toda uma série de rituais surgiram, desde grandes fogueiras a lançamentos de fogos-de-artifício, poemas e canções contra e a favor dos atos de Guy Fawkes, popularizando-se inclusivamente o uso de uma máscara que recordava a face do azarado terrorista católico (e que em 2006 inspiraria o argumento do filme “V de Vendetta”, produzido por James McTeigue), misturando-se com rituais ancestrais como os do festival celta do Samahain (Escócia e Inglaterra) e do Calan Gaeaf (País de Gales), que marcam o ano novo celta e o início do inverno.

Muitos dos rituais e superstições à volta da “Guy Fawkes Night” influenciaram inclusivamente as práticas populares do atual Halloween, tradição levada por emigrantes escoceses e irlandeses para os Estados Unidos da América e que rapidamente se tornou o sucesso que hoje em dia se conhece.
 

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