Idalécio Rosa: Onze anos depois do futebol
Idalécio Rosa: Onze anos depois do futebol
Idalécio Rosa: Onze anos depois do futebol

Idalécio Rosa: Onze anos depois do futebol

As rasteiras da vida por vezes transformam-se em novos começos... 

Esta podia ser mais uma história de vida típica de um jogador de futebol com muita experiência na I Liga Portuguesa, que após 20 anos como defesa central (1991 a 2011) e presença em cerca 350 jogos, pendura as chuteiras, segue a carreira no mundo futebolístico como treinador e hoje treina uma equipa em Londres. Podia ser este o enredo, mas o caminho de Idalécio Rosa foi outro, este atleta que passou pelo futebol português de forma discreta, encontrou um novo trilho repleto de novas experiências e estabilidade.

Quando falamos de Idalécio Rosa recordamos aquele “centralão” com 1,96 metros de altura, um atleta que — apesar de não ter representado um dos chamados grandes — passou por clubes como o SC Braga, Rio Ave, Nacional da Madeira, Farense, entre outros, ou seja, Idalécio é uma cara bem conhecida dos adeptos de futebol e conhece como poucos os relvados dos clubes portugueses.

O ex-atleta fez as malas e rumou a Londres! O fim da sua carreira como futebolista, direta e indiretamente, levou Idalécio a emigrar, dois anos depois de sair do futebol, o ex-atleta afirma que em Portugal não conseguiu encontrar uma opção que oferecesse estabilidade financeira e em conjunto com Rita (a sua mulher) resolveu recomeçar do zero, rumando sozinho a Londres em busca de uma nova vida.

Os primeiros meses e anos foram desafiantes, o ex-futebolista trabalhou num casino e na restauração, mas hoje, passados 9 anos, Idalécio vive em Londres com a sua família e, contra todas as expectativas, durante a pandemia covid-19 encontrou uma profissão que o realiza e oferece a estabilidade que procurava.

Idalécio esteve à conversa connosco e partilhou mais pormenores do seu percurso. Conheça mais sobre Idalécio Rosa, a vida durante e depois do futebol.

Idalécio Rosa

O futebol era o teu sonho de menino. O que sentiste quando a carreira como jogador chegou ao fim?

Foi difícil, saber que tinha de deixar de fazer uma das coisas que mais prazer me dava, que era jogar futebol.  Idalécio relembra com saudade os treinos com os seus colegas, a competição e todos os pequenos e grandes momentos que viveu.

Que momento destacas na tua carreira no futebol?

O meu primeiro contrato profissional. Depois de ter feito toda a minha formação no Louletano cheguei aos juniores do clube e fui emprestado para ganhar competitividade e mais tarde vestir a camisola principal. Este foi sem dúvida um grande marco na minha vida pois foi o concretizar de um sonho de criança ser profissional de futebol.

Se voltasses aos anos de futebolista, mudavas alguma coisa?

Não mudaria nada daquele que foi o meu percurso e postura profissional, sempre me dediquei ao máximo e sempre dei o melhor de mim. Foi um prazer ter representado tantos clubes com muita história no campeonato português e ter tido a possibilidade de trabalhar com grandes profissionais do futebol.

Terminada a carreira no futebol, qual foi o teu rumo profissional?

Quando acabei a carreira tive a oportunidade de trabalhar no ramo imobiliário, como comercial, com uns amigos que tinham uma empresa em Faro. Depois de uma longa carreira não era fácil ficar em casa sem ter o que fazer, foram tempos difíceis. Infelizmente, quando terminei a carreira não consegui ter estabilidade. No meu caso, naquela altura, Portugal não ofereceu nem a mim, nem à minha família, soluções para uma vida estável no nosso país.

A solução foi procurar uma nova vida além-fronteiras, foi uma decisão difícil?

Sim, foi uma decisão difícil, até porque mudar de País implica muita coisa. Custou-me muito deixar a família por alguns meses até me adaptar a uma nova realidade com o objetivo de encontrar melhores condições e estabilidade para as trazer para junto de mim, só queria uma vida melhor para todos. Idalécio sublinha que a sua mulher Rita sempre foi um grande apoio em todos os momentos da sua vida e que ver-se longe das filhas Catarina, na altura com 15 anos, e Francisca de 13, foi um dos maiores desafios da sua vida.

Rumaste a Londres, já tinhas uma oportunidade à espera?

Ainda não tinha nada, apenas o apoio do meu cunhado João Serio que deu todo o seu apoio e disponibilizou um quarto até eu conseguir organizar a minha vida. Mal cheguei a Londres em março de 2013 comecei logo a distribuir currículos. Um deles deixei num casino no centro de Londres e foi onde surgiu a minha primeira oportunidade quase um mês depois de ter chegado ao país.  Este foi um tempo de aprendizagem para o ex-jogador que aproveitou para perceber como funcionava o mercado de trabalho local e para praticar o seu inglês, esta seria uma grande porta de entrada para o que estava por vir.

Também trabalhaste em hotelaria e restauração, como surgiu essa mudança?

Sim, após seis meses no casino, onde ganhei muita experiência, surgiu uma grande oportunidade no mercado hoteleiro e lá fui eu para mais um grande desafio. Mas desta vez já com o apoio e companhia da minha esposa. Conta-nos com um sorriso na cara.

Estive dois anos no Caffé Concerto, uma cadeia de restaurantes de estilo europeu onde comecei como empregado de mesa, após seis meses passei a supervisor e um ano depois era o “Assistant Manager”. Mais tarde tive uma curta passagem pelo The Duck and Rice e é então que surge a possibilidade de trabalhar no Novikov (considerado um dos melhores restaurantes de Londres) onde trabalhavam muitos portugueses que me deram bastante apoio.

Idalécio com amigos e família

Várias figuras públicas frequentam o Novikov, tens alguma história caricata que possas partilhar?

Sim, são muitas as personalidades, desde o mundo do futebol ao mundo do cinema que passaram e passam pelo restaurante Novikov. Houve uma história com o Ator Michael Keaton (fez o papel de Batman) que me surpreendeu. Pedi para tirar uma fotografia com ele, respondeu-me logo que sim mas só depois de terminar a sua refeição. Ao terminar, levantou-se e veio ter comigo para tirarmos a fotografia, fiquei radiante. Logo depois informou-me que gostava de tirar mais fotografias na cozinha onde estavam os chefes do restaurante. Foi incrível quase que paramos o serviço nesse dia. O Michael Keaton deixou-nos a todos felizes naquele dia não só pela sua simpatia e humildade, mas também pela situação em si tão especial e caricata.

Como foi a experiência no Novikov? O que se seguiu?

Os 4 anos que trabalhei no restaurante foram de facto uma experiência incrível, éramos como uma família com mais de 300 empregados mas tive que tomar a decisão de mudar para uma área completamente diferente. Foi então que comecei a trabalhar como Concierge no Soho Hotel sempre no sentido de procurar uma melhor qualidade de vida, com melhores horários, menos stress e com possibilidades de crescimento pessoal e profissional.

Mas esta foi uma passagem curta…

Sim, estava a gostar muito da nova experiência, no entanto e com a chegada da Covid-19 o Hotel viu-se obrigado a fechar portas durante algum tempo e fui obrigado a repensar a minha vida.

Após tantos sacrifícios e novas experiências, alcançaste a vida estável que procuravas?

Quando surgiu a covid-19 achei que tudo ia voltar a piorar, mas ao contrário disso hoje estou a trabalhar para uma grande empresa de software Inglesa em Londres, também com sede em Bristol, Cambridge e recentemente expandimo-nos para a China, Índia e Polónia.

Agora e passados nove anos em Londres, olho para trás e tenho orgulho do percurso que fiz. Foram anos de muitos os sacrifícios e desafios que me permitiram crescer a todos os níveis. Hoje somos uma família feliz e realizada, apesar de não estar ligado ao futebol que foi sempre um grande sonho de criança, sinto que encontrei o meu espaço.

O futuro das minhas filhas, acredito que esteja bem encaminhado, elas estão felizes, mas nunca se sabe o dia de amanhã tanto para nós, como para elas, mas sem dúvida Londres tem muitas oportunidades para oferecer, são jovens ainda têm muitas metas e oportunidades pela frente.

Idalécio Rosa e as filhas e a mulher em Londres

Dizem que o sonho comanda a vida. Sentes que ainda tens sonhos por concretizar?

Concordo com essa expressão, o meu sonho era ser jogador de futebol e esse foi concretizado com muita alegria. Só posso agradecer todos os dias tudo o que me tem acontecido e acredito que muitos outros sonhos possam vir a acontecer, faz parte do dia-a-dia de cada um de nós, criamos sonhos e queremos alcançá-los sempre com alegria e motivação a cada dia que passa.

Tens um grande carinho por Portugal já pensaste em criar o teu próprio negócio, por exemplo, representar uma marca portuguesa em Inglaterra? 

O carinho pelo meu País é único e tenho muito orgulho em ser português, por tudo o que foi o meu passado e por tudo aquilo que me ensinou. De momento não me vejo a voltar a Portugal e sim acredito que mais cedo ou mais tarde possa representar uma empresa portuguesa aqui em Inglaterra. Existem algumas ideias, contactos e até vontades. Apesar da estabilidade mantenho sempre a mesma ambição.

Existem muitos jovens a viver com o dilema da emigração, também eles sentem que Portugal não oferece a qualidade de vida que desejam. Que conselho podes deixar?

Com o Brexit o mercado britânico não está tão fácil como antes. No entanto os portugueses na sua maioria têm uma capacidade muito grande de adaptação e de superação com finais felizes nas mais variadas profissões, aqui podemos encontrar muitos exemplos de sucesso. A minha história é apenas uma no meio de muitas outras que tenho testemunhado ao longo desta minha longa estadia. Para aqueles que tenham essa possibilidade, aconselho que venham com uma mentalidade aberta, vencedora e com uma grande capacidade de sacrifício, pois sem isso será difícil adaptarem-se a este novo contexto político. Existem muitas oportunidades, com condições muito melhores que em Portugal. A todos os que estiverem a passar por dificuldades digo-lhes para arriscarem sem medos e que procurem ser felizes por cá ou por outro país, eu arrisquei e dei-me bem.


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