A Alimentação e o Custo de Vida Face à Guerra

A Alimentação e o Custo de Vida Face à Guerra

O conflito que se vive no Leste da Europa obriga os consumidores a fazer novas contas ao rendimento mensal face à escalada de preços que se faz sentir, semana após semana, a cada ida ao supermercado. A escassez de matéria-prima, como os cereais, e a subida do valor da energia ajudam a explicar estas alterações, mas poderão os portugueses suportar o mesmo cabaz por muito mais tempo?

No setor agroalimentar, há quem já fale de um “aumento brutal” de preços nos próximos meses. Porém, importa relembrar que esta tendência, embora possa ser mais evidente, não é de agora. No final de 2021, os preços dos bens alimentares já registavam algumas subidas. O impacto da covid-19 na cadeia de abastecimento, o aumento do custo das matérias-primas e a subida dos preços da energia, associada à seca que o país atravessa, têm contribuído para o incremento do custo dos alimentos, com impacto imediato na fatura apresentada aos consumidores.

Contudo, e se de alguma forma pudéssemos considerar o aumento dos preços um processo mais discreto, os sinais de mudança fazem-se agora sentir a passos largos a cada ida ao supermercado. Carrinhos com 63 produtos, é definido com base na estrutura de consumo das famílias do INE, o cabaz alimentar inclui, entre outros produtos, alimentos tão básicos como leite, queijo, manteiga e fiambre, arroz, farinha, 1 kg de massa, 1 kg de açúcar, 1 kg de carne de peru, 1 kg de carne de frango, 1 kg de carapau, 1 kg de pescada, 1 kg de cebola, batata, cenoura, banana, maçã ou laranja.

Veja aqui a variação semana a semana.

Aliado a um contexto de incerteza sanitária, o conflito que se vive no leste da Europa deverá criar ainda mais instabilidade para a economia global. Atualmente, o Brasil e a Ucrânia são as principais origens de importação de cereais para a Europa, pelo que se espera uma oferta cada vez mais limitada de cereais provenientes da Ucrânia, responsável pela importação de uma quantidade considerável (26%) para a União Europeia. Esta realidade força a uma procura de cereais em mercados alternativos, de modo a evitar que a sua limitação se reflita num incremento dos preços nos mercados internacionais.

No que aos cereais diz respeito, Portugal é, historicamente, um país muito dependente dos mercados externos, importando cerca de 80% dos cereais consumidos internamente. A Ucrânia tem sido, até à data, um dos nossos maiores fornecedores de cereais para alimentação animal. Em 2019 exportou para Portugal cerca de 244 milhões de euros em bens, entre os quais bens agroalimentares, maioritariamente milho, colza e óleo de girassol.

Este cenário é particularmente relevante, sobretudo se a Ucrânia deixar de ser uma opção para abastecer o território nacional – uma visão incerta que, associada à escalada de preços dos combustíveis, poderá ter consequências extremas na distribuição de bens alimentares, na produção agrícola e nas despesas familiares com alimentação. 

Algumas empresas de distribuição e associações representantes do setor agroalimentar em Portugal já antecipam aumentos. Algumas cadeias de distribuição estão já, inclusive, a impor limites à compra de produtos como o óleo de girassol, uma medida preventiva para evitar o açambarcamento por parte dos consumidores. 

No panorama atual, todos estes fatores representam já um aumento no preço do cabaz por parte dos consumidores. Mas a insustentabilidade do acompanhamento desta volatilidade terá de ser alvo de análise, com respostas concretas e urgentes que se revejam num novo aumento do poder de compra dos portugueses. A volatilidade dos mercados e dos próprios acontecimentos não nos permitem tirar conclusões, enquanto organização de defesa do consumidor consideramos que os impactos devem ser absorvidos por todos os intervenientes na cadeia e não apenas pelos consumidores. Acreditamos que está a ser feito um esforço nesse sentido.


Rita Rodrigues_Deco Proteste

Rita Rodrigues, Head of Public Affairs da DECO PROTESTE

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