A Forte Relação do Norte de Portugal a Santiago

A Forte Relação do Norte de Portugal a Santiago

Património Cultural das rotas portuguesas a Santiago de Compostela

A História, as Lendas e o Património dos Caminhos de Santiago

Capítulo III – Fernando I de Leão, o primeiro peregrino do Caminho Português

O Caminho Português, também conhecido por Via Lusitana, é o segundo itinerário mais percorrido pelos peregrinos até Santiago de Compostela (Galiza), só superado pelo Caminho Francês.

Desenhado muito antes dos inícios da nacionalidade, utilizando para isso as antigas vias romanas, descritas no célebre “Itinerário de Antonino”, podemos distinguir a história das peregrinações portuguesas ao túmulo do Apóstolo em quatro fases: antes da nacionalidade; depois da nacionalidade; na Idade Moderna; na atualidade.

Começando pelo período anterior à fundação de Portugal, recordemo-nos da importância dos aglomerados populacionais de origem celta, os Castros, espalhados um pouco por toda a orla costeira, desde as praias da Galiza, até chegar às margens do Tejo, merecendo especial relevo os castros de Santa Tecla, na Galiza, e, no lado de cá da fronteira, o castro de S. Lourenço, em Esposende, a citânia de Briteiros, em Guimarães, de Sanfins de Ferreira, em Paços de Ferreira ou mesmo o extinto castro de Penaventosa, onde hoje se encontra a magnifica Sé Catedral do Porto.

E a cidade do Porto tem aqui uma importância fundamental em todo o contexto das peregrinações jacobeias, não só porque daqui partem três rotas atuais (como veremos no próximo capítulo) mas porque, adentrando no universo da lenda, com uma grande dose de fé, as crónicas dizem que o Apóstolo Santiago, a caminho das terras do fim do mundo (a atual Costa da Morte, entre a cidade de Padrón, nas Rias Baixas galegas, até Finisterra e Múxia), terá passado pela Portus Cale romana, entre os anos 35 e 40 da nossa era e aqui (ou nas cercanias) terá convertido duas personagens que a tradição nos descreve como sendo Basílio ou Basileu, que terá sido nomeado pelo Apóstolo Santo como primeiro bispo do burgo à beira-Douro, e Pedro de Rates, reconhecido como o primeiro bispo de Bracara Augusta e da Ibéria (por essa razão o titular da cátedra bracarense é ainda hoje reverenciado como “Arcebispo-Primaz das Espanhas”).

Entre a história, a lenda e a tradição, a verdade é que a relação que o norte de Portugal tem com a devoção a Santiago Maior é muito forte, desde que o túmulo do Apóstolo foi encontrado no meio do bosque Libredón, por volta do ano 830. A provar essa conexão com o culto jacobeu está a fundação da primeira igreja em honra ao santo fora do território galego, precisamente em Castelo de Neiva (Viana do Castelo), sagrada, contam as crónicas, pelo bispo Nausto, de Coimbra, em 862, segundo inscrição ainda presente no templo. Para além deste facto temos ainda as doações realizadas pelo rei Afonso III das Astúrias (cognominado O Grande, foi o responsável pela construção da segunda versão da basílica compostelana, a partir de 872) do mosteiro de S. Frutuoso de Montélios (883) e da Igreja de S. Vitor (899) ao bispo compostelano. Ambas pertenciam, naquela época, à diocese de Braga e tal facto azedou as relações entre ambas as cidades, acabando mesmo em rutura, séculos mais tarde, com o famoso episódio do “Pio Latrocíno”. Refira-se ainda a doação da vila de Correlhã (Ponte de Lima) à mesma diocese, desta feita realizada pelo rei Ordonho II, em 915. Vale a pena assinalar que as doações à sé compostelana, à revelia de Braga, não ficaram por aqui e continuaram inclusivamente no período posterior à fundação da nossa nacionalidade.

Se nos focarmos na matéria da rota jacobeia, podemos assinalar que a primeira demanda à tumba do Apóstolo relatada em território onde mais tarde viria a nascer Portugal identifica o rei Fernando I O Magno, de Leão como o primeiro peregrino do Caminho Português, no ano de 1064.

A história relata que o monarca, ávido em se tornar o primeiro a derrotar o mais temido caudilho muçulmano, Almançor, decide pedir a proteção e ajuda de Santiago na conquista de Coimbra. Ao final de seis meses de cerco alcança a tão ansiada vitória, que terá ocorrido a 9 de julho de 1064, aplicando a primeira derrota ao fervoroso comandante mouro, responsável em anos anteriores, pela destruição das cidades do Porto, Braga e Santiago (famoso se tornou o relato do transporte dos sinos de catedral apostólica para Córdova, para servirem, consta-se, de candeeiros, e ainda o facto de Almançor ter ordenado às suas tropas para que não tocassem no túmulo de Tiago Zebedeu e dos seus discípulos, Teodoro e Atanásio), entre outras.

Fernando I peregrina, desde a atual cidade dos estudantes até Compostela, acompanhado por Sesnando, bispo do Porto, “inaugurando” assim o Caminho Português.


Lê toda a rubrica  | 
Capítulo I – Entre a história e a Tradição, um nome para a eternidade
Capítulo II – Antes do Caminho de Santiago, o Caminho pré-cristão
Capítulo IV - Os Caminhos Portugueses a Santiago
Capítulo V – Rota do Património da Costa Atlântica Portuguesa
Capítulo VI – Da Capital do Gótico ao Reduto dos Templários
Capítulo VII – Tomar: O bastião Templário que salvou Portugal
Capítulo VIII – O Tesouro da Rainha Santa na cidade dos Estudantes
Capítulo IX – Em Santiago para Agradecer o Milagre das Rosas
Capítulo X – O Caminho na rota da Gastronomia
Capítulo XI - O Caminho passa pela Rua Colorida
Capítulo XII - O Caminho Ganha Nova Dimensão
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